Canavieiras, na Bahia, mantém relação promíscua com a indústria Veracel

• Canavieiras é uma pequena cidade da Costa do Cacau, na região sul do litoral baiano, formada por sete ilhas marinhas. A cidade chama a atenção pela arquitetura bem conservada e ruas largas, quarteirões bem divididos. É o paraíso das bicicletas, que circulam pelas ruas planas, dispensando o uso de ônibus coletivos, que aliás, nem existem na pacata e bonita cidade. Banhada por lindas praias de águas calmas e mornas e sol na maior parte do ano. Ingredientes perfeitos para a implementação do turismo. Será?
• TURISMO IGNORADO - Apesar das belezas naturais do lugar, a prefeitura de Canavieiras acredita que a cidade foi edificada no local errado e que a exuberante natureza que cerca a cidade nada vale, portanto, não faz o menor esforço para desenvolver turismo nem divulga as praias da cidade, tem ojeriza a visitantes, banaliza uma das indústrias mais retáveis de nossos dias, o turismo. Mas tudo isso tem uma “explicação”, e esta fica a cerca de 200km do lugar, e atende pelo nome de Veracel.
• A industria de celulose, Veracel, de olho nas áreas planas que cercam o município de Canavieiras, movimentou técnicos e dinheiro no intuito de forrar o solo do município com eucalípto, matéria-prima para a produção de celulose e fabricação de papel, o que mudaria radicalmente a paisagem do lugar, como já acontece no extremo sul da Bahia, onde as áreas transformadas em florestas de eucalíptos não permite a sobrevivência de nenhum bicho da mata. Na prática, as região tomadas pelas exóticas plantações de eucalíptos, não existem borboletas, insetos, repteis, pássaros ou qualquer forma de vida que habitam a naturalmente nossas matas. É um quadro desolador, uma paisagem melancólica e triste, além da suspeita de enfraquecimento do solo.
• Mas como dinheiro é a razão de vida de uma prefeitura, Canavieiras foi abduzida pela Veracel e, inclusive tem despejado criteriosamente dinheiro, comprando o povo com exames médicos, cursos e benefícios que deveriam existir na cidade com a iniciativa da própria prefeitura, mas esta deixa por conta da industria Veracel que exerce na cidade o poder de comando de fato, o prefeito apenas de direito.
• A Veracel mantém a imprensa da cidade abastecida de recursos para fazer campanha enaltecendo suas atividades e gabando a mesma por financiar “zilhões” de áreas reflorestadas, como se a própria Veracel não fosse responsável por ocupar também outros “zilhões” de áreas oriundas de mata atlântica com suas infinitas florestas de eucaliptos.
• SURGE A RESEX - Para o desespero da Veracel, o governo federal criou recentemente uma Reserva Extrativista Marinha em Canavieiras (Resex), nos municípios de Canavieiras, Belmonte e Una (BA) que beneficiará aproximadamente 2.300 famílias de extrativistas, num total de cerca de 11.000 pessoas que vivem principalmente da pesca e da mariscagem.
• Abrangendo uma área aproximada de 100 mil hectares, dos quais 85 mil são em área marinha, 12 mil de manguezal e três mil de terras continentais da União, a reserva está inserida numa área de extrema importância biológica, sendo fundamental para a conservação do bioma Mata Atlântica e para o fortalecimento do Projeto Corredores Ecológicos.
• A reserva promoverá o uso sustentável dos recursos naturais da região e servirá como exemplo de que é possível garantir o sustento da população beneficiada, numa convivência harmoniosa com a natureza, perpetuando as riquezas ambientais que tanto valorizam o município. A Resex nasceu do consenso das comunidades tradicionais, do apoio técnico de organizações não governamentais.
• CÓLICA DA VERACEL - A criação da Resex foi uma pá de areia nas pretenções da Veracel que reagiu energicamente para mudar a situação. Os planos de expansão da indústria inclui justamente a área da Resex, portanto a prefeitura tem se posicionado radicalmente contra a criação da Reserva e tentou, inclusive obstruir todas as reuniões e eventos que envolviam o tema na cidade. Como se não bastasse implementou perseguição aos dirigentes do Ibama e chegou ao cúmulo de vasculhar a vida pessoal do chefe da Resex na cidade.
• Na campanha contra a Resex, a indústria financia material impresso de alta qualidade, com bandeirolas confeccionadas com material de alto padrão (afinal, de papel eles entendem), camisas, bonés e, através da prefeitura insufla o povo da cidade em passetas e protestos contra as instituições que promovem o meio ambiente sustentável. Em resumo, a prefeitura esquece o seu papel de administrar a cidade e gasta todo o seu tempo com um tema que envolve dinheiro a curto prazo.
• Uma verdadeira campanha publicitária foi financiada pela indústria com o título contraditório de “NATUREZA SIM, RESEX NÃO”, passeatas, panfletagens, propagandas em jornais e revistas, além de videos, sites e blogs, enfim uma inusitada força-tarefa em defesa de uma relação promíscua envolvendo um poder público (prefeitura) e a indústria de grande porte, Veracel.
• Enquanto isso, o turismo em Canavieiras continua esquecido. Quiçá, quando alguém lembrar de Canavieiras, vai encontrar pelo caminho uma paisagem tomada por eucalíptos.
• Marcos Mauricio